quinta-feira, 9 de maio de 2013

Em busca da "calmaria"




Em "A Cidade e as Serras", uma de suas últimas obras, Eça de Queirós parece fazer questão de tentar nos passar a ideia de que o campo é melhor que a cidade. Porém qual é seu verdadeiro objetivo ao fazer isso? Quisera ele simplesmente contemplar a serra numa clara reflexão de um de seus últimos desejos, ou seja, passar os dias que lhe restavam em vida num lugar com paz e tranquilidade? Ou teria ele um objetivo maior, criticando alguns males da sociedade e introduzindo até mesmo certas ideias de sustentabilidade?

                O livro conta a história de Jacinto, um rico jovem parisiense que a princípio fica obcecado por bugigangas e inovações tecnológicas. Porém, ao decorrer da história ele fica cansado de todas as “futilidades” de sua vida, como a agitação desnecessária, a poluição, e até mesmo o excesso de complicações para fazer praticamente tudo. Graças a isso, Jacinto começa a ficar depressivo e abatido. Percebe-se logo ai que, mesmo tendo sido publicado há mais de um século, o livro trás problemas atuais, como o stress da vida na cidade, e nos leva a um questionamento: será que uma vida tão agitada, cheia de complicações e inutilidades, supostamente tidas como “benefícios trazidos pelo progresso e pela vida em sociedade”, realmente vale a pena?

                Ficando cada vez mais depressivo, Jacinto finalmente é convencido por Zé Fernandes, seu melhor amigo, a sair da cidade e passar alguns dias nas serras portuguesas. Inicialmente Jacinto não gosta da ideia, porém ao chegar lá, Jacinto acaba gostando da simplicidade, e ao ver-se livre de todas as complicações, percebe que o excesso de futilidades era a razão de sua depressão, e ao passar seus primeiros dias de verdadeira tranquilidade, fica revitalizado.

                Porém, após algum tempo no campo, Jacinto sente novamente a atração pela tecnologia, e decide levar uma inovação tecnológica para o campo: o telefone, invenção que beneficia todos a sua volta. Nesse trecho pode-se perceber uma “estabilização” entre a antes desprezada vida na cidade, com seus avanços tecnológicos, e a antes idolatrada vida no campo, com sua paz e tranquilidade: chega-se num meio termo, o uso sustentável da tecnologia, ou seja, a implantação no campo sem poluir a natureza e sem causar nenhuma destruição desnecessária.

                Jacinto então, vendo os benefícios que o telefone trouxe, percebe que o campo havia sido praticamente esquecido pelo governo da época, e decide fazer algo para ajudar a população e começa a fazer varias coisas para melhoras as condições de vida dos camponeses. Destaca-se nessa parte do livro um problema presente até os dias atuais, a pobreza nas áreas fora das cidades e a negligência do governo em relação a essas áreas. Afinal de contas, realmente poderiam existir um ou dois “Jacintos” no nordeste brasileiro, pois a situação de lá é a mesma há séculos, e ninguém parece se importar.

                Após a leitura de “A Cidade e as Serras”, pode se perceber que é um livro que, mesmo aparentemente tratando de temas bucólicos e monótonos, na verdade ainda apresenta o tom critico característico de Eça de Queirós, porém desta vez um pouco menos escancarado, e que a obra, mesmo centenária, ainda retrata assuntos que podem ser trazidos para a atualidade, como o desprezo do meio ambiente em razão dos avanços tecnológicos e a pobreza nas áreas rurais. Mesmo sendo uma leitura muito mais monótona do que outra obras de Eça, “A Cidade e as Serras” ainda é uma leitura atraente para os admiradores do Romantismo e até mesmo do Parnasianismo, e uma leitura indispensável aos amantes de Eça de Queirós.